05 outubro 2010

 Sobre fábulas e realidades

Era uma vez um país que ainda era muito novinho. Quase não tinha casas.
Então, o rei, que não morava naquelas terras, mandou uma porção de amiguinhos seus para lá, prometendo enormes extensões de terra para eles. Chamaram essas imensidões de " Capitanias Hereditárias". Ou seja, nunca estiveram lá e já ganhavam como herança para seus descendentes.
Acontece que por lá já viviam milhares de pessoas, que eles chamavam de índios. E como hoje se sabe, essas pessoas viviam livres e se serviam da terra, dos rios, das matas e dos animais, em equilíbrio.
Os homens (as mulheres não opinavam) que diziam ser suas as terras perseguiram os índios, prendiam-nos, escravizavam-nos e, quando tentavam fugir, como lhes era natural, matavam-nos.
Demarcaram a terra, e emitiram documentos dizendo que as terras eram suas.
Como não conseguiam escravizar os índios, tiveram a absurda idéia de buscar pessoas noutro continente. Começava a escravidão naquele país. Foram mais de 4 milhões de pessoas trazidas em porões de navios, acorrentadas, separadas de suas famílias, machucadas, muitas morriam durante a viagem.
Mas aqueles homens que se diziam donos das terras queriam ter produção agrícola cada vez maior, portanto precisavam cada vez mais de pessoas. Com isso a escravidão naquele país durou 388 anos!
Depois, quando o número de pessoas nascidas naquele país já era significativo, decidiram libertar os escravos. Livravam-se assim da responsabilidade de alimentá-los, tratá-los, abrigá-los. Os mesmos escravos que trabalhavam sem salário agora tinham que trabalhar por salários absurdamente baixos e sem receber nada mais dos antigos senhores.
Foram deixados pelas periferias das cidades que se formavam naquele país. Ou mantinham-se vinculados aos antigos senhores por total falta de alternativas. Pobres. Analfabetos. Desvalidos.
Os filhos dos filhos dos filhos dos senhores das Capitanias Hereditárias mantinham suas terras, os meios de produção, as fábricas e o acesso a educação como propriedades suas. Assim garantiam sua posição social e seus ganhos com o trabalho, quase escravo de milhares de pessoas.
Para tentar convencer as pessoas de que suas propriedades eram legados de seu Deus, que por elas tinham direito histórico, contavam uma história de uma galinha que teria "achado" alguns grãos de milho e os queria plantar.
Mas aí, um certo homem, trabalhador de uma fábrica, mesmo sem ter podido estudar, levantou sua voz e conclamou multidões para fazer um outro país.
Foi eleito presidente daquele país e começou a redistribuir o que tinha sido amealhado durante séculos das pessoas mais pobres. Pediu perdão aos povos do outro continente pela escravidão imposta pelos antepassados das mesmas pessoas que o mantiveram na fábrica cuja máquina arrancou um dedo seu.
E decidiu ajudar a garantir aos descendentes dos primeiros moradores daquele país, os índios, parte das terras que, de direito secular, eram suas.
Garantiu que aquelas pessoas que se mantiveram ricas com o trabalho dos outros também participassem da riqueza do país que por aquela época estava se tornando um dos mais ricos da terra por ter descoberto uma imensa jazida de petróleo e pelo campo produzir cada vez mais.
Não se sabe como a historia terminou pois ela ainda está sendo escrita.
Dizem que cada uma das pessoas daquele país contribui com o que faz e com o que deixa que façam por si na construção da dessa história.
Por enquanto, o povo tem demonstrado que quer ser o artífice de seu futuro, fazendo daquele país um orgulho de resgate da dignidade e de participação de todos os seus povos irmãos.
E luta contra as mesma forças que apostam na volta da dependência, do obscurantismo e da centralização.

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